quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Querido diário


Essa semana completei 500 km percorridos com minha lambreta. E isso em 1 mês. Nem é tanto, é? Ela tá fazendo quaaaase 30 km/L. Toda vez que abasteço e calculo dá 29,8. Como um relógio. Acho que se eu maneirar na mão dá pra chegar nos 30. De qualquer forma, o clima não está mais tão propício para se andar de moto. O frio tá apertando. De manhã e de noite, quando basicamente a uso, beira os 12 graus. Durante o dia chega a uns 20. E por falar em manhã, estou indo para academia nesse período. Levanto às 08:00. Chego lá umas 08:30. Saio umas 10:00 e chego no trabalho umas 10:30. Com isso, acabo saindo mais tarde lá do instituto, por volta das 19:30, 20:00. Mas estou gostando da nova rotina. Vamos ver se consigo manter o pique mesmo tendo que levantar nesse frio danado. E a academia, junto a uma alimentação bacana, de um tempo pra cá, tá trazendo alguns resultados e deixando pra trás alguns quilos excedentes. Mas ainda tem muuuuuito pra melhorar, ainda mais sob um olhar tão crítico como o meu. Mas estamos na estrada certa. Mas que não é mole, não é não. Porém tem algo me ajuda a lidar com minha gula. A idéia é antiga, mas botei em prática só por agora. Junto com uns amigos criei o CCC – Clube dos Cozinheiros Casuais. Nos encontramos uma vez por semana na casa de um dos membros, o qual deve cozinhar para os demais. Os visitantes da vez levam as bebidas. E assim a gente come atéee, bebe e se diverte. É meu dia livre pra comer. Adoro. Passo a semana esperando o danado. Não só pela comida, mas pela companhia dos amigos. E a propósito, esse fim de semana é minha vez. E adivinhem o cardápio? Feijoada!!! Vou tentar achar as carnes certas e preparar uma feijoada bacana, com direito a farofa Yoki e tudo. Espero que eu acerte a mão e que o pessoal goste. Ai, dá até água na boca. Ah, por falar em boca, ontem fui ao dentista fazer um molde dos meus dentes. Com esse molde ela vai fazer o meu aparelho, que consiste em um conjunto de moldeiras, tipo aquelas pra clareamento. É um aparelho moderno aí, do tipo quase invisível. É móvel e se chama Invisalign. E meus dentes são tortos, sim. Não é preciosismo meu. Enfim, daqui 2 semanas volto lá pra ver a simulação do tratamento no computador e, se aprovado, pego o primeiro kit de moldeiras duas semanas depois. O tratamento deve durar cerca de 1 ano e meio. Mas o sorriso Colgate vai valer a pena. Afinal, como já dizia o profeta: corpo são, mente sã. Falta mesmo agora só ocupar o coração, que de tão vazio faz eco quando bate. Mas não se preocupem. Que dá pra ser feliz sem um grande amor, dá. Ainda não sei bem como, mas tô aprendendo! J

sábado, 18 de setembro de 2010

Pai e filho


Uma bela música. Um belo diálogo entre um pai e um filho. O pai fala e aconselha com serenidade, sabedoria. Já o filho responde com o entusiasmo e veemência de um jovem cheio de certezas. E de uma certa forma vejo de um lado e do outro peculiaridades que refletem um pouco do 'Thiago' de ontém, e também de hoje.

domingo, 22 de agosto de 2010

Ainda somos os mesmos, e vivemos comos nossos pais.


Hoje é domingo. Agora são 14:20. O dia aqui em Gênova ta ensolarado e quente. Acordei tarde. Lá pelas 11:30, depois de me virar e desvirar na cama dezenas de vezes, morrendo de preguiça. Dei uma bela espreguiçada, pedindo licença pros quatro travesseiros e usando toda a diagonal da cama de casal. Levantei e liguei o computador, como de praxe. Acordei com saudade. Saudade de casa, de Brasil, de pai e mãe. Esses dias baixei na internet uma coletânea chamada “O melhor do Brasil”. Tem Vinícius, Toquinho, Cazuza, Caetano e Marisa Monte, entre outros. Coloquei pra tocar e fui pegar as roupas do varal, que já estavam ali há quase uma semana. Definitivamente, algo que não gosto de fazer. Logo, aproveitei o entusiasmo matinal e, colocando no cabide ou dobrando, dei um jeito em tudo ali. Botei também mais roupa pra lavar.

Como já era tarde, resolvi pular o café da manhã. Pra começar a pensar no almoço, decidi abrir uma cerveja. Tinha tudo a ver com a música: “Não deixe o samba morrer”. Cantando sozinho e tentando dançar algo parecido com samba, fui ver que na dispensa não tinha muita coisa. Final do segundo mês de bolsa é dureza. Tinha uma lata de ervilha, spaghetti, um pote de extrato de tomate, um creme de leite e granola. No freezer, um peito de frango congelado, hambúrguer e mais duas recém colocadas long necks. Na geladeira, meia cebola e presunto cru. Bem, como tava com fome, peguei o presunto e abri a lata de ervilha pra fazer de tira-gosto. Lembrei do Tio Júnior, lá no Fartura. Eu era pequeno. Lembro-me da cena dele sentado naquela mesa ali da cozinha, aquela perto do fogão a lenha, com o toldo branco atrás dele. Enquanto eu me deliciava com o queijo-de-minas dentro de um pão-de-queijo ele comia ervilhas e tomava cerveja. Pra mim, algo totalmente estranho. Milho até vai, mas ervilha? Eco! Mas o mundo dá voltas e, hoje, era eu a saboreá-las.

Coloquei o frango pra cozinhar. A idéia era desfiá-lo. A primeira long neck acabou e abri a outra. Como ela não tava ainda muito gelada, coloquei um pouco num copo e voltei o resto pro freezer. E aquilo me lembrou muito o Mansões Coimbra. Os almoços de fim de semana ali me marcaram. É um dos momentos familiares mais gostosos que me lembro. Com os quatro na cozinha, a gente conversava. De fundo, tocava Rádio Executiva (92.7, senão me engano). Todos bebendo cerveja, menos eu. Meu pai e eu irmão com uma latinha e minha mãe com um copo de vidro, metade cheio. Ela no fogão, preparando alguma coisa. Eu, sentado perto da geladeira e bebendo Guaraná, cortava a cebola. Meu pai, temperando um queijo-de-minas com orégano e azeite, ouvia nossos causos. O Bi, sentado perto da porta pra sala, de frente pro fogão e com um garfo na mão, quando não comia o queijo, fazia batucada. O cheiro de cebola e alho fritando era uma delícia. Quando era dia de estrogonofe, não tinha como não ir lá na panela beliscar um pedacinho de carne. Depois, com as panelas tampadas e fogo baixo, era hora de por a mesa. Tarefa, historicamente, do caçula, aff.. Depois do almoço, meu pai sempre lembrava “cada um lava seu prato”. De barriga cheia eu ia pro meu quarto, mexer no computador e o Gabriel pro quarto dele tocar guitarra. Meus pais iam pro quarto deles. Minha mãe, abraçada com seus travesseiros, dormia rapidinho. Meu pai, com dois travesseiros na cabeça e barriga pra cima, dormia com o controle remoto na mão. De tarde o Gabriel ia pro ensaio da banda e eu, com minha bicicleta, ou ia pra casa do Murilo ou pra casa da Déa. Mas, antes de sair, ia sempre lá avisar meus pais “oh, to saindo, qualquer coisa to com o celular. Mais tarde to de volta” e dar um beijo neles, já sonolentos.

Bem, no fim das contas, terminei a segunda cerveja e meu almoço tava pronto. Era um estrogonofe com frango desfiado que, pro lugar do arroz, foi acompanhado por um spaghetti. Até que ficou gostoso. Depois, fui pendurar as roupas que tinham acabado de lavar, escovei os dentes e vim escrever esse texto. Sei que essa solidão e nostalgia que to sentindo hoje é também fruto das minhas escolhas. Eu que decidi deixar pra trás família, amigos e amores. Seja quando deixei Goiânia e fui pra Florianópolis ou agora, que estou na Itália, fui sempre atrás de realizações pessoais. Sabia que tinha muitas coisas pra conquistar e que não podia ficar ali, parado. Meu mundo era maior que aquilo. Queria viver sonhos que eu sabia que poderia viver só naquele momento. Ou era naquela hora, ou nunca mais. Porém, a vontade de deixar tudo pra trás e voltar pra casa vai sempre existir. São momentos simples assim, como um almoço em família, que me enchem de certeza de que meu lugar não é aqui, longe da minha família. Mas aprendi que tudo tem seu tempo. A terceira cerveja ta quase acabando. Uma “lezêra” tomando conta. É, é hora do cochilo depois do almoço de domingo, meus pais.

domingo, 8 de agosto de 2010

Pai nosso..


Pai nosso que está em Juruti,

Amado por ser esse homem,

Veio a você essa família

Que criou com força de vontade,

Tanto em Rondonópolis como em Goiânia.


Eu me orgulho a cada dia e ainda mais hoje,

De ser fruto de suas crenças,

Assim como da família que formamos:

O que somos nunca será perdido.

E posso estar longe um montão,

Mas te amarei sempre meu pai.


Amém.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Era uma vez uma um disco saudável


"Iniciais sintomas de discopatia degenerativa L5-S1. Disco 5 com interespaço conservado; inicial desidratação do trato sub-ligamentar do disco; significativo bulging discal contido na sede mediana mas em conflito com a camada no canal normal; a componente extrusa migra parcialmente para baixo, mantendo-se em conflito com a camada da linha do meio; recessos laterais nos limites normais."

É, essas frases são assustadoras. Amanhã vou ao médico para saber quantos meses ainda tenho de vida..

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Cerveja, saúde e alegria

Depois da novela “Páginas da Vida” acho que deve ta na moda ver a vida como um livro. A propósito, quem me conhece sabe que minha vida é um livro aberto. E sabe também que sou puro clichê. Acredito que Deus nos dá o enredo, mas que é cada um de nós que escreve sua própria estória. E quando paro pra pensar nos meus 20 e poucos anos como autor me deparo com um fato: eu não poderia ter melhor protagonista pra minha estória que minha família. Quanto mais viajo, conheço outros lugares e outras pessoas, mais me orgulho e agradeço por ter nascido entre pessoas tão especiais. Assim, de capítulo em capítulo, vou caligrafando e aprendendo a escrever de maneira sempre melhor minha própria vida. Cada capítulo com suas tramas, personagens, cenários e clichês. Tem mocinho, tem vilão. Tem princesa, sapo que vira príncipe encantado e tem castelo. Tem início, meio e fim.

Era pouco mais da metade de maio. Estava eu vivendo um capítulo difícil, daqueles que machucam, mas também ensinam. Estava cansado. Queria ir pra casa ver pai, mãe, irmão. Precisava sentir todo aquele amor incondicional que eles simplesmente exalam, sem pedir nem medir. O destino era a Amazônia. E a ocasião era muito favorável. Era o quinquagésimo aniversário da minha mãezinha querida. Além disso, estão construindo a nossa primeira casa. Motivações e saudade eram o que não faltava. Assim, depois de pegar trem, avião, ônibus e barco, cheguei em Juruti acompanhado do meu irmão. No dia da chegada, toda a euforia foi alimentada com picanha, mandioca e vinagrete. E, pra dar início às mudanças, uma geladíssima cerveja. Um dia eu aprenderia a tomar cerveja. Afinal, se o Tio Rodrigo conseguiu deixar a Coca-Cola de lado, eu também conseguiria deixar a caipiroska. Com certeza é o início de uma nova era, onde a Oktoberfest ganhará sua devida importância, e dessa vez lá em Munique. Confesso que estou começando a me acostumar com o sabor da danada, embora ainda prefira minha vodka com frutas. Assim, com o paladar cada vez mais refinado e o ar-condicionado ligado, pude, depois de quase sessenta horas de viagem, dormir de verdade.

Nos dias que passamos em Juruti fui colocando o fuso-horário e a saudade em dia. O dia era movimentado em virtude da obra da casa. Sempre tinha pepino pra resolver. A gente sempre estava por lá, dando palpite e sentindo uma satisfação danada com a casa ganhando forma. No tempo livre, comida. No almoço, carne assada. Na janta, peixe. Tirei a barriga da miséria. De todos os lados vinham sensações gostosas. Num dia fomos conhecer o projeto do papai, e em outro tomar banho num igarapé. No dia do niver da mamãe, a casa não estava pronta. Mas quem liga pra isso? Inauguramos do mesmo jeito. Fizemos ali a primeira de muitas e muitas festas. Celebramos ali a primeira de muitas e muitas conquistas que essa casa vai ver. E também abrimos ali primeira de poucas e poucas garrafas de Moët & Chandon, que, de tão boa, não queria nem quebrar. Foi tudo bem simples (exceto pelo champagne), mas muito gratificante. Passar esse dia ao lado da família foi um presente não só pra aniversariante, mas pra todos nós.

O próximo destino era Alter do Chão. Esse era o cenário perfeito pra eu dar início a um novo capítulo da minha vida. Pegamos a lancha e, depois de cinco horas, um pastel de carne e um guaraná, chegamos a Santarém. Alugamos um carro e fomos encontrar a Cibele lá em Alter. Ela tinha acabado de chegar da sua viagem a bordo de um barco pelo rio Tapajós. Era o tal do Abaré, o qual porta com si saúde e alegria pras comunidades ribeirinhas. Lindo projeto. Depois de botar o papo com a prima em dia, de um banho de piscina e de um belo jantar, fomos dormir pra no dia seguinte subir novamente a Serra do Piroca e conhecer a tal Floresta Encantada. Depois de um farto café da manhã, fomos pra praça esperar duas meninas do sul, companheiras da Cibele no Abaré, que fariam os passeios conosco. Eram elas a Luana e a Joyce. Fazem medicina. E adivinha onde? Florianópolis. Mesmo tendo morado na mesma cidade por quase 5 anos, fomos nos conhecer só no meio da Amazônia. Ê mundinho pequeno. Confesso que a primeira impressão delas poderia ter sido melhor caso não tivessem chegado de Havaianas pra fazer a trilha. Porém, como rapidamente perceberam o equívoco, colocaram um tênis e foram extremamente simpáticas ao longo de todo o dia, saíram com a moral lá em cima. Agradeço a Luana, que fez um “quem for voltar pra Alter em setembro do ano que vem bota o dedo aqui porque já vai fechar” e fez com que o grupo se unisse e prometesse se reencontrar. Agradeço à Joyce pela agradabilíssima companhia ao longo de todo o dia, noite, madrugada e manhã seguinte, por responder a curiosidades acerca do corpo humano e por ter virado a página e iniciado um novo capítulo da minha vida. Papai e mamãe não fizeram a trilha, já que papai estava com a perna machucada. Mas não se iluda, pois mesmo assim foi ele quem ganhou a corrida de barcos no fim do passeio da Floresta Encantada.

É, mas como diz o velho ditado “tudo que é bom dura pouco”. Estou eu de volta a Genova, longe de tudo que mais amo. Mas estou feliz, em paz. Quero viver, crescer, aprender. Estou com fome disso. É como querer fazer caligrafia pra melhorar a letra. Não é que desejo entrar pra Academia Brasileira de Letras ou ganhar um prêmio Nobel de literatura escrevendo a minha estória. Quero só viver meus clichês e sonhos. E se sonhar é o primeiro passo pra se realizar um sonho, ter uma família dessas é o primeiro passo pra chegar no felizes para sempre.

sábado, 8 de maio de 2010

Aqui e agora


Ah, a primavera! Tempo agradável, dias bonitos. Sol. As árvores todas cheias de folhas novamente. As colinas de Gênova deixam o amarelo vômito de lado e se cobrem de um verde típico de Amazônia. O frio vai sendo esquecido aos poucos e os agasalhos ficando lá no fundo do armário. As lojas liquidam o restante do estoque de inverno. Boa época pra comprar jaquetas e moletons a preços bacanas. Mas tem também coleção nova. As calças viram bermudas. As camisetas ficam mais coloridas. As boates do centro histórico fecham e aquelas próximas ao mar reabrem. Definitivamente, respira-se um ar diferente.

Engraçado como por aqui as estações são bem típicas e definidas. E isso não se refere só ao clima. No inverno tudo bem, é um frio do caramba. De vez em quando até neva. Temperatura por volta de zero graus. Quanto às pessoas, praticamente todos vestem preto. Sobretudos pretos são chiques. Dizem na TV que quem veste preto não erra nunca. Opção segura. As pessoas parecem mais tímidas e fechadas. Os bares com as portas fechadas e aquecedores no máximo. Do lado de fora, janelas embaçadas. Lugares underground e vinhos são o que há. Já na primavera, que delícia! O sol já se faz presente com freqüência suficiente para ser aprovado no fim de um ano letivo. A temperatura beira os 20 graus. Escurece só por volta das 21:00. As ruas ficam mais cheias. A academia recebe aqueles que se preparam para o verão. As pessoas parecem mais sociáveis. O lado latino, que hibernou para o inverno, desperta. E assim tudo parece mais vivo. Querendo ou não, é hora de viver o aqui e o agora, por inteiro. E melhor estação que essa pra isso não há. Ao menos até o verão chegar..

ps: a foto é da rua onde moro. Vai reto uns 40 metros, é o prédio à direita.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Fizeram a gente acreditar

"Fizeram a gente acreditar que amor mesmo, amor pra valer, só acontece uma vez, geralmente antes dos 30 anos. Não contaram pra nós que amor não é acionado, nem chega com hora marcada.

Fizeram a gente acreditar que cada um de nós é a metade de uma laranja, e que a vida só ganha sentido quando encontramos a outra metade. Não contaram que já nascemos inteiros, que ninguém em nossa vida merece carregar nas costas a responsabilidade de completar o que nos falta: a gente cresce através da gente mesmo. Se estivermos em boa companhia, é só mais agradável.

Fizeram a gente acreditar numa fórmula chamada "dois em um": duas pessoas pensando igual, agindo igual, que era isso que funcionava. Não nos contaram que isso tem nome: anulação. Que só sendo indivíduos com personalidade própria é que poderemos ter uma relação saudável.

Fizeram a gente acreditar que casamento é obrigatório e que desejos fora de hora devem ser reprimidos.

Fizeram a gente acreditar que os bonitos e magros são mais amados, que os que transam pouco são caretas, que os que transam muito não são confiáveis, e que sempre haverá um chinelo velho para um pé torto. Só não disseram que existe muito mais cabeça torta do que pé torto.

Fizeram a gente acreditar que só há uma fórmula de ser feliz, a mesma para todos, e os que escapam dela estão condenados à marginalidade. Não nos contaram que estas fórmulas dão errado, frustram as pessoas, são alienantes, e que podemos tentar outras alternativas.

Ah, também não contaram que ninguém vai contar isso tudo pra gente. Cada um vai ter que descobrir sozinho. E aí, quando você estiver muito apaixonado por você mesmo, vai poder ser muito feliz e se apaixonar por alguém"


John Lennon

terça-feira, 4 de maio de 2010

Visita Presidencial


Hoje o presidente da Itália vem visitar o instituto. O esquema de segurança é fortíssimo. Atiradores de elite no terraço e, dizem as más línguas, que também nas colinas ao redor. Pra entrar, só com crachá no peito e passaporte. Do lado de dentro, está tudo arrumado, limpo e organizado. Espalharam plantas e posters por todo o laboratório. Pela foto do pessoal aqui do Departamento de Robótica Avançada dá pra ver que tudo parece estar nos trinques. Agora só falta botar o robô pra dançar samba na esteira.

domingo, 2 de maio de 2010

Tenho a vida, tenho minha liberdade.




Não tenho casa, não tenho sapatos
Não tenho dinheiro, não tenho óculos
Não tenho roupa, não tenho suéteres.
Não tenho fé, não tenho barba
Não tenho mente

Não tenho mãe, não tenho cultura
Não tenho amigos, não tenho escolaridade
Não tenho nome, não tenho amor
Não tenho passagem, não tenho ficha telefônica
Não tenho Deus

O que eu tenho?
Porque eu estou viva?
Sim, o que eu tenho?
Ninguém pode se livrar disso

Tenho meu cabelo, tenho minha cabeça
Tenho meu cérebro, tenho minhas orelhas
Tenho meus olhos, tenho meu nariz
Tenho minha boca, tenho meu sorriso

Tenho minha lingua, tenho meu queixo
Tenho meu pescoço, tenho meus seios
Tenho meu coração, tenho minha alma
Tenho minhas costas, tenho meu sexo

Tenho meus braços, tenho minhas mãos
Tenho meus dedos, tenho minhas pernas
Tenho meus pés, tenho meus dedos dos pés
Tenho meu fígado, tenho meu sangue

Tenho vida, tenho minha liberdade
Tenho a vida, vou conservar isso
Tenho a vida, vou conservar isso

sábado, 1 de maio de 2010

Sonhar

Me desculpem aqueles que entram aqui procurando textos legais. Não quero escrever, não ando com a mínima vontade, ou inspiração, pra isso. Essa música ouvi num CD do Chico Buarque, mas quem cantava era a Maria Bethânia. E ela diz muito do que eu queria falar agora.

quinta-feira, 25 de março de 2010

Entre calos, espinhos e sonhos



Era uma vez um andarilho. Suas primeiras lembranças eram os seus primeiros passos. Ele já deixou para trás passos de formiga e passos de gigante. Já quis construir telhados verdes, construir máquinas de trovão, salvar os animais, mudar o mundo, ser um inventor, um doutor. Sonhava alto. E muitas vezes ele pagou caro por isso. Mas nunca deixou de caminhar.

Quando era jovem teve que deixar sua cidade natal. Ele não sabia bem por quê. Ainda era muito jovem para compreender certas coisas. Somente caminhou. Seu destino era um belo vilarejo, com muito verde e vida. Por ali ele encontrou outros como ele. Sentia-se em casa, em família. Caminhando, ele cresceu. E foi caminhando que conheceu uma linda rosa. Ficou completamente hipnotizado. Naquele instante aprendeu o verdadeiro significado da palavra “amor”. Entregou-se, de corpo e alma. De que adianta amar se não for por inteiro? Amor não se poupa, não se pede. Simplesmente floresce, encanta e conquista, como um belo jardim na primavera.

Com o passar do tempo aquele belo vilarejo foi ficando pequeno para o andarilho. Sentia que era hora de partir. Ele sabia exatamente pra onde ir, apesar de não saber o que iria encontrar por lá. Antes de partir, despediu-se do invejável jardim que havia cultivado ao longo dos anos ali no vilarejo. Havia flores do campo, lírios, e, claro, sua amada rosa. Aquele jardim lhe preenchia a alma. Assim, inundado entre dúvidas e certezas, se foi. O caminho era longo, árduo. Os calos iam aparecendo com a naturalidade de cada passo. A dor se fazia presente. Olhava para trás e via no horizonte tudo o que estava deixando para trás. Sempre se perguntava se aquele era o caminho certo. Teria sido muito mais fácil para ele ter ficado. Então por que partiu? Não tinha maturidade para responder a todas as dúvidas que o afligiam. Muitas vezes pensou em desistir e voltar. Mas algo lhe dizia para seguir em frente. Era mais forte que suas vontades, que seus mimos.

O andarilho, agora já não tão jovem, chegou a uma bela praia. Não conhecia ninguém ali, mas sabia que ali era seu lugar. Sentiu-se um peixe fora d’água. Arrumou um trabalho. E com ele se distraía. O trabalho era duro e nem sempre prazeroso. Os calos passaram dos pés para as mãos. Estava ali somente de corpo. A alma e coração havia deixado lá no belo vilarejo. A nostalgia tomava conta dos seus pensamentos. Mas o inverno aproximava-se, rigoroso, como há tempo não se via. Sentiu medo. Temia pelo jardim que deixara no vilarejo. A distância, implacável, se fazia presente. Um jardim não sobrevive sem alguém que o regue, que arranque as pragas, que lhe de atenção. Pequenos detalhes fazem toda a diferença. Nesse caso, a intenção não é o que vale. Quando soube que sua mais bela rosa havia morrido perdeu a fé. Sentia os espinhos da rosa entranharem na sua pele. Não havia nunca sentido dor maior. Jurou nunca mais cultivar rosas. Queria voltar para casa. Queria colo de mãe, tapinha no ombro do pai. Mas estava tudo tão longe. Estava tão sozinho. Só o tempo seria capaz de transformar aquelas feridas abertas em cicatrizes.

Mudaram as estações. O sol, tímido, nasceu novamente. Era primavera. Como fazia todos os dias, o andarilho caminhava. Cego a toda vida que o cercava, tropeçou. Quando olhou para baixou viu os cadarços desamarrados. Agachou-se para amarrá-los. Foi quando, então, viu uma bela rosa, ali, ao alcance das suas mãos. Ela quebrava a monotonia do verde na paisagem. Sensações misturaram-se. Estava confuso. Rosas são belas, mas machucam. Lembrando-se da promessa que havia feito, amarrou os cadarços e seguiu em frente. Porém, desse dia em diante, sempre que passava por ali reparava naquela rosa. E dia após dia, a rosa o cativava mais, e mais. Ele se deu conta que havia jurado algo que não poderia cumprir. Inútil resistir ao que vem de dentro. Entregou-se ao amor, novamente. Em pouco tempo havia de novo um belo jardim. Era feliz. Fazia novamente planos e sonhava. Sentia-se vivo.

Mas a sina daquele homem era clara. Ele era um andarilho. Seu trabalho tinha chegado ao fim por ali. A estrada era de novo seu destino. Aos olhos do andarilho, o mundo era como um relógio. E ele, com seus passos, era quem dava corda ao relógio. Sabia que não podia parar de caminhar, ou melhor, de correr. Correr atrás dos seus sonhos. Era algo que vinha de dentro, sem muita explicação. Porém, mais uma vez teria que deixar para trás o que aprendeu a amar. As cicatrizes marcadas em sua pele não o deixavam esquecer os riscos daquela sua decisão. Mas ele era convicto. E então, partiu.

Entretido com seus sonhos, o andarilho só se deu conta do quanto já havia caminhado quando seus calos voltaram a doer. Havia chegado a uma bela fazenda, no alto de uma montanha. A paisagem era diversa daquela com a qual estava acostumado. As árvores não tinham folhas. O chão estava coberto pela neve. Mas ele gostou. Era esperto e inteligente. Rapidamente se entrosou e se ocupou de diversas tarefas. Quando batia a saudade, ele fechava os olhos e conseguia ver seu colorido jardim na praia. Lembrava da rosa, do seu perfume e do quanto era sedosa. Isso lhe trazia conforto e tranqüilidade, lhe dava força pra seguir em frente.

O tempo, tirano, passava. E a distância, mais uma vez, passou a perna no andarilho. Havia recebido notícias da praia. As notícias não eram boas. Seu jardim não aguentou a fortes tempestades tropicais, as quais caíram como lágrimas, trazendo dor e destruição. Sua rosa era morta. Ele parecia não acreditar, ou melhor, queria não acreditar. Sentia novamente a dor dos espinhos perfurando sua pele. Desolado, chorou. Foi a única maneira que encontrou para extravasar sua dor e medo. Sentia-se novamente uma carcaça. Oca, frágil. Estava aprendendo ali que não existe jardim que suporte à distância, embora tivesse sempre acreditado no contrário. Aquilo o atingiu fundo. Quebrou algumas de suas convicções. Naquela noite ele não fez promessas impossíveis a si mesmo. Acreditava que Deus escreve certo por linhas tortas. Então, com serenidade, ele simplesmente continuou a fazer aquilo que sempre fez de melhor. Ele continuou a sonhar. Afinal, todos nós somos feitos da mesma matéria que nossos sonhos.

sábado, 13 de março de 2010

As crônicas de um lar, doce lar

“Isso é uma bomba! Você tem que limpar bem esse filtro aqui, porque senão entope e explode. Ah sim, é perigoso. Tá bom? Bem, primeiro você coloca água até o nível dessa válvula de segurança. Depois coloca o filtro aqui, assim, e depois o café aqui dentro. Pode por bastante, porque senão fica sem graça. Água preta. Mas não o pressione senão a água não passa direito. Agora enrosca a parte de cima. Pronto! Pode por no fogo. Usa fogo alto no início, mas depois abaixa porque assim a água passa mais devagar pelo café e pega mais sabor.”. Essa foi a última lição do Sr. Giovanni: como usar uma cafeteira italiana e fazer um bom café. Mas bem, vamos começar a contar a estória lá do início.

Era início de fevereiro. Tinha acabado de voltar aqui pra Itália. Devia procurar casa para morar. E também um colega pra dividir um apartamento. Quando vim já sabia que não iria morar com o Michele, pessoa com quem dividi o apartamento ano passado. Ele tinha me avisado que queria morar sozinho. No início achei ruim, sabe como é, a gente se acomoda com as coisas. Mas algumas mudanças vêem para o bem. “Quem sabe não encontro uma pessoa bacana, inclusive que não saiba falar italiano e assim eu também pratique mais meu inglês?”. E foi assim que encontrei o Petar. Ele também estava procurando uma pessoa pra dividir um apartamento. Já é um pouco mais velho (29) e faz aniversário pertinho do meu, dia 16 de setembro. Iniciou o pós-doc lá no instituto em dezembro. É búlgaro, mas viveu os últimos 4 anos no Japão. Fez doutorado por lá. E acho que acabou pegando algumas coisas dos japoneses, como por exemplo: está sempre rindo, é cortês e abaixa um pouco o tronco quando te cumprimenta. Pareceu-me uma boa pessoa para dividir um apartamento. Ah, e não fala italiano além de “buongiorno”, “ciao” e “vorrei una lasagna”. Em contrapartida seu inglês é ótimo. E foi assim, com uma boa impressão, ao menos da minha parte, que selamos um acordo verbal e começamos a procurar apartamento.

Ao menos duas vezes por dia entrava nos sites imobiliários daqui de Gênova. Queria um apartamento mais perto do instituto, mas por via das dúvidas procurava em todos os bairros. Vai saber, né? As opções a um preço razoável eram poucas. Não se podia escolher tanto. Quando achava alguma coisa interessante, ligava. Ia lá ver o apartamento. E era sempre uma decepção. Ou o apartamento era velho, feio e escuro, ou custavam os olhos da cara, ou eram em lugares completamente fora de mão. Por duas semanas foi assim. Até que achei um que tinha um bom preço e, pelas fotos do site, parecia bom. Ah, e era perto do instituto. Daria até pra pegar a van pra ir e voltar pro trabalho quase em frente em casa. Liguei na imobiliária e marquei uma visita. Como esse era o mais interessante até o momento, fiz questão que o Petar me acompanhasse pra ver o que achava. Saímos do instituto às 17:30 e já estava começando a escurecer. Encontramos a moça da imobiliária e fomos ao apartamento que era ali perto. Quando chegamos ao apartamento, a primeira surpresa: os donos estavam lá. Uau, que consideração. Bacana. Um senhor mais velho, com cerca 70 ou 80 anos, com sua esposa e um rapaz mais jovem, provavelmente seu filho. Começaram a nos mostrar o apartamento. Dois quartos, um maior com cama de casal e outro menor com cama de solteiro; uma grande sala de TV; cozinha pequena mas conjugada com outra sala; dispensa; banheiro; hall de entrada; sacada. Ideal pra duas pessoas. Nem grande nem pequeno. Mas o conto de fadas termina por aqui. Os donos não estavam muito simpáticos, principalmente o velho. Parecia incomodado com alguma coisa. Pensei que fosse pelo fato de sermos estrangeiros ou por conversar com eles em italiano e depois traduzir, na medida do possível, em ingrêis pro Petar. Como no início, quando nos apresentamos e nos cumprimentamos, disseram que não falavam inglês, talvez pensassem que eu estava aproveitando o fato para difamar o apartamento, ou eles, sei lá. Velho tem cada besteira. De qualquer maneira, o apartamento era bom e as coisas bem conservadas. Muitas delas novas. Quando sentamos na sala para conversarmos sobre alguns detalhes veio a bomba: os donos moravam no apartamento de baixo. “Puts, que azar! Claro que o apartamento tinha que ter um defeito. Se eu arrotar na cozinha eles virão aqui reclamar. Imagina se fizermos alguma festa. Vou ter que comprar uma pantufa pra poder andar em casa”. Mas mesmo assim fomos embora com uma boa impressão do apê: era barato, grande e bonitinho. E a posição era ótima. Assim, mesmo sabendo que podíamos estar dando um tiro no pé tendo os donos tão perto, decidimos ficar com o apartamento.

Depois de longas duas semanas, com alguns percalços pelo caminho, conseguimos assinar o contrato. Nesse dia fiquei bem feliz. Não só por ter assinado o contrato e ter uma bela casa para morar, mas pelo velho dono, a partir de agora intitulado de Sr. Giovanni, ter sido bem mais simpático. Conversando com a moça da imobiliária descobri o motivo pelo qual o Sr. Giovanni estava de cara feia no dia que fomos ver o apartamento: tiveram que fazer um ‘gato’ para que tivesse luz na casa naquele dia, pegando-a lá do apartamento deles. Nosso apartamento não tinha luz nem gás. E como um bom idoso, é sistemático. Compreensível.

Com o contrato assinado pegamos as chaves e viemos, todos, ao apartamento. O Sr. Giovanni gostaria de nos mostrar “algumas” coisas. “Normal”, pensei. Como um bom idoso, ele também é metódico. Fazia questão de me ensinar tudo, como se fosse uma criança. Com paciência, ouvi tudo com bastante atenção, mesmo que por dentro estivesse pensando “qualé velhinho, sou um engenheiro, faço doutorado, não sou bobo”. As lições começaram no portão do prédio: “Essa aqui é a chave. Coloca devagar, sem forçar. Quando ela chegar até o fim.. ouviu o barulho? Aí sim você gira. Vai, tenta você agora.”. Parece brincadeira, mas não é. E assim as lições foram indo até entrar em casa, quando passamos então para nível intermediário. “Não deixem as persianas muito para cima porque senão quando chove suja as janelas”, “esse é registro geral do gás, vocês devem fechá-lo quando saírem de casa porque se vaza a casa explode”, “aqui você liga a bomba d’água. Não esqueçam de desligá-la porque senão a pressão nos tubos fica alta e se tem algum vazamento ela vai ficar funcionando e pode alagar a casa”, e assim foi para todos os registros e interruptores da casa. Desse jeito eu teria que acordar 10 minutos mais cedo pra dar tempo de desligar e fechar tudo antes de ir pro trabalho. Haja paciência. Mas por trás de toda aquela ladainha sentia que estava uma pessoa de um bom coração, preocupada com o seu imóvel (é a primeira vez que alugam o apartamento) e penso que também em nos ensinar algumas coisas, mesmo que óbvias. Suas intenções eram boas, como a de um avô sistemático e metódico que teima em achar que seus netos não cresceram.

Cerca de 5 dias depois instalaram a luz aqui no apartamento. Então já me mudei pra cá. Comecei a arrumar as coisas. No fim de semana comprei cabides e pude desfazer a mala. Que alívio. O problema é que ainda estávamos sem gás, e, consequentemente, sem água quente. Ou seja, sem banho. Eca, né? Que nada! Nesse frio aqui não se sua e o fedor vem com menos naturalidade. Uma semana sem tomar banho não seria um grande sacrifício. Queria estar na minha casa. E o tempo passou rápido. Hoje vieram instalar o gás. Já conhecendo o Sr. Giovanni, o avisei alguns dias antes que viriam hoje instalar o gás para que ele pudesse vir acompanhar tudo. Quando o rapaz do gás chegou, fui lá embaixo e chamei o Sr. Giovanni. Ele veio, olhou tudo atentamente, inclusive que a casa estava organizada. Ficou feliz. Depois que instalaram o gás, ele disse “Espera aí que vou ali embaixo pegar uma coisa e já volto”. Pensei que fosse um manual de como acender o forno ou abrir o registro do gás. Algo assim. Mas não. Voltou com dois sacos de café e sua mulher, a Sra. Amália, trazendo doces. Realmente me surpreenderam. Ensinou-me a usar a cafeteira, claro, e depois tomamos o café acompanhado de uma boa conversa e saboreando o doce, que parecia um pé-de-moleque coberto de chocolate. E quer saber? Aos poucos as dúvidas e receios de antes estão indo embora. E se do lado de baixo veem lições, do lado de dentro vem uma gostosa sensação de me sentir em casa.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Em cada porto, uma lição.



Ah, a tal da primeira vez. Sempre tão difícil. Cheio de dúvidas e com receio de tudo. Algumas vezes é bom, outras nem tanto. Em algumas dói, em outras dá tudo errado. Umas instintivas, outras puros clichês. Eu, por exemplo, me lembro bem de coisas como o primeiro beijo e o primeiro McDonalds. Já de outras, não: a primeira vez que respirei fora da barriga da mamãe, a primeira palavra falada, a primeira vez que vi o mar. E ainda espero por outras e outras, como o primeiro salário, o primeiro carro, o primeiro filho. Cansa até de pensar no tanto de coisas que temos pra aprender. A propósito, vou contar um pouquinho da minha primeira vez de ontem.

No começo da semana rolou um assunto pelos corredores do instituto. O boato era que iria nevar na sexta e que sábado o dia estaria ideal pra esquiar. Depois de alguns emails e outros dias, estava sacramentado: partiríamos às 06:10 do sábado com destino à estação de esqui.

Era sexta-feira à noite. Estava em casa fazendo um arroz para a janta. De aperitivo queijo com vinho. Depois de três taças o arroz ficou pronto e o Léo chegou em casa. Fizemos um bifinho de frango e a janta estava pronta. Continuamos a beber vinho, agora acompanhado de uma boa prosa. E assim foi indo. A primeira garrafa acabou e veio a segunda. Quando nos demos conta, o relógio mostrou 01:00. Hora da última taça. Não iríamos deixar sobrar 4 dedos de vinho naquela altura do campeonato. Pronto! Mais uma garrafa pro lixo de recicláveis. Fomos então deitar e esperar o despertador às 04:30.

Mesmo de mal com o relógio, levantamos na hora prevista. Pegamos um ônibus público às 05:20 e fomos para o lugar de onde sairíamos para a tal aventura. Eram 05:50 quando chegamos lá. O restante do grupo foi chegando e com 5 minutos de atraso o ônibus saiu para a estação de esqui. Naturalmente, quase todos dormiram no longo trajeto de 3 horas até lá. Eu tentei também, mas um certo enjôo me perturbava. Não sei se seqüelas da noite anterior, das poucas horas de sono ou do ovo mexido daquela manhã. Me concentrei para não vomitar. Enfim, cochilei. Quando abri os olhos estava tudo branco. Era neve pra todo lado.

Ao chegar na estação, fomos alugar o equipamento de esqui. Com todo os apetrechos no corpo vieram as primeiras lições: “para frear basta fazer um “V” ao contrário (ou seja, um A sem o tracinho do meio); para virar, gire o tronco que o esqui acompanha. Ok?” É, na teoria parecia fácil. Tinham até criancinhas que passavam à toda velocidade. Pensei "é, não deve ser um bicho de sete cabeças".

“Quê? Balela!” Na primeira descida comecei a embalar e o tal do “V” ao contrário virou um “X” e só consegui frear com o atrito do bumbum no chão. "E agora, como levanta?" Tinha pulado essa lição. O peso do esqui e seu tamanho me impediam de fazer os movimentos que queria. Era impossível. Foram talvez os 10 minutos mais constrangedores das 'primeiras vezes' de que me lembro. Ouvia risadas de crianças que passavam por mim. Olhares de pena. Mas ajudar que é bom, ninguém! Ah! Desci de bunda mesmo. Mas sou brasileiro e não desisto nunca, certo? "Vamos tentar de novo." Foi quando o constrangimento deu lugar ao medo. Além de não conseguir frear estava indo na direção de uma descida com bandeirinha vermelha. Girei o tronco. “Ué, não bastava girar o tronco que o esqui acompanhava?” Mesmo não sabendo muito sobre as cores, a descida azul ao lado me parecia muito mais simpática que a vermelha. Dessa vez foram necessários o bumbum e as mãos pra conseguir parar. “Tsá, quer saber? Que brasileiro que nada. Desisto.” Tirei os esquis e fui sentar. Fui desabafar minha frustração e desapontamento ligando pra Lia, apesar da hora. Com um bom tom psicológico, ela me acalmou. Porém, isso não foi suficiente para eu mudar de idéia e enfrentar aquilo ali sozinho de novo.

Fiquei ali um bom tempo, comi um sanduíche e uma banana que tinha trazido de casa. Aos poucos foram chegando outros do grupo ali na mesa. A minha situação causou pena. Foi aí que alguns do grupo me acolheram e me pegaram como pupilo. Subimos até o topo da montanha e fomos descendo devagarzinho. A inclinação era pequena. Era mais fácil frear. Aos poucos fui aprendendo a fazer curva também. A diversão foi se fazendo presente. A tormenta tinha passado. Ah, e o visual? Espetacular. Fiquei por um tempo admirando aquela paisagem em silêncio. Definitivamente, um novo porto para um marinheiro de primeira viagem. Estava sentindo ali uma das coisas que vim buscar aqui no velho mundo: primeiras vezes.